12 janeiro 2007

Decreto de execução

Quando nós estudamos Direito Administrativo vemos o professor Hely Lopes Meirelles dizer que o decreto não deve ser uma mera reprodução da lei, pois se tal ocorresse seria inútil. Continua, o mesmo professor, o decreto deve detalhar a lei.
Mas afinal de contas o que significa isso? Se você como eu sempre teve essa dúvida, agora talvez eu possa ajudá-lo a clarear o seu entendimento a respeito da matéria.
Vamos às obviedades. O Poder Executivo existe para dar execução à lei. Mais especificamente. O Executivo detém o instrumental necessário à implementação prática da lei. Um exemplo deixará mais claro. Uma lei pode dizer que um determinado tratamento de saúde é direito do povo. Para concretizar esse direito o Executivo conta com um hospital onde mobilizará os recursos materiais e humanos necessários para tanto.
É aqui onde o decreto entra. A forma de prestar o tratamento pode ser escolhida ao bel-prazer de quem se encontre atendendo no momento? Não. O decreto de execução conterá uma instrução para os serviços públicos de que forma o direito será implementado. Mais um exemplo para tornar claro. O decreto poderá estipular documentos que deverão ser apresentados, exames necessários à uma eventual internação etc. Além de ser uma ordem genérica a todos os servidores dos serviços públicos o decreto vai estabelecer a forma de utilização dos serviços públicos que irão concretizar os referidos direitos.
Por esta última conclusão resta claro que o particular sujeita-se a eles quando busca um serviço público, mas o decreto não se estende além do serviço público, motivo pelo qual, por exemplo uma lei como o código civil jamais admitirá um decreto de execução, pois não depende do Estado para que os direitos ali consagrados se consubstanciem.

04 janeiro 2007

Razoabilidade e proporcionalidade

Em regra vemos os autores falarem em razoabilidade e proporcionalidade, mas sem, contudo, exporem as suas essências ou entranhas. Eles geralmente intuem o que elas sejam, mas parecem não conseguir traduzir em palavras o venha a ser a razoabilidade ou proporcionalidade.
Vou agora propor conceitos, que na minha humilde opinião talvez sirvam para fixar um marco divisor entre as duas espécies. Pode-se falar em razoabilidade quando os meios empregados sejam adequados aos fins almejados. Ou seja, quando os meios guardem estreita correlação com os fins (iria utilizar a palavra proporção, que seria muito mais significativa, mas para evitar quaisquer enganos em relação à proporcionalidade a substituí por correlação). Um exemplo traduzirá melhor o que tento dizer. Imaginemos que um dado empregado de uma dada empresa inicie uma discussão com colega de trabalho e venha a destratá-lo chamando-o de imbecil. À empresa é facultado aplicar-lhe uma entre três espécies de punição pela falta cometida. São elas advertência, suspensão, dispensa. Dentre as três qual a melhor se adequaria ao fato? Pronto você ao responder à pergunta acabou de utilizar a razoabilidade. Neste ponto alguns poderão indagar, mas qual é a resposta certa: advertência, suspensão ou dispensa? Ao que eu respondo que não há resposta certa, pois pelo princípio da razoabilidade todas estão corretas. Por mais impressionante que seja é isso mesmo, pois o princípio abebera-se em altas doses de subjetividade, não devendo, no entanto, afastar-se muito do que determinaria o senso comum para o fato específico do qual o juiz é portador. Tal constatação é que permite a magia da advocacia. É nestes espaços que necessariamente devem ser preenchidos no caso concreto que atua o advogado. Também não veja-se isso como um mal, pois seria impossível uma lei regular de forma justa cada um dos fatos, com as nuances que os diferenciam de todos os demais, no mundo fenomenológico, ou seja, cada fato é essencialmente circuntancial e por assim dizer único, não se podendo dizer, pois, essencial, embora apresentem algumas características básicas que permitem elaborar normas que irão orientar o julgamento. Todavia tais características só podem ser constatadas dentro das circunstâncias dos fatos, motivo pelo qual temos juízes, advogados e promotores. Voltando ao exemplo da punição do empregado, para que uma lei estabelecesse justamente a punição nela própria, independentemente de qualquer juízo de valor do aplicador dela, deveria informar como a briga deveria começar (mas não de forma genêrica e sim específica, por exemplo quando o João, que é uma pessoa de pouca paciência, começar uma briga... e tal só valeria para o João esquentadinho) quais as palavras específicas de agravo que deveriam ser proferidas, que certamente é impossível, pois em última instância terminaria por implicar na necessidade de uma lei para cada fato específico da vida de cada ser humano que está sobre a face da terra, o que em último caso implicaria na supressão da própria idéia de lei.
Voltando ao tema. Proporcionalidade por seu turno é a aplicação na medida adequada dos meios aos fins propostos. Ou seja, no caso da proporcionalidade não nos interessa a modalidade do meio e sim a quantidade. Novamente um exemplo vai esclarecer. No exemplo acima, se a punição selecionada fosse a suspensão, esta poderia ser de um a trinta dias. Qual a quantidade de dias de suspensão puniria adequadamente o fato? Quem nos dará a resposta será o princípio da proporcionalidade, nos mesmos termos do princípio da razoabilidade, ou seja, por meio do senso comum do juiz.
Wagner Alcântara. Advogado