08 maio 2012

Deserto da minha vida

A realidade

O vento açoitava o meu rosto e a areia cortava a minha pele. O sol escaldante se encontrava à pino. Todos esses elementos pareciam ainda mais terríveis em cima da duna mais alta que a minha vista conseguia alcançar. Em todas as direções a única coisa que eu conseguia ver era apenas aquele mar de areia, sufocante, solitário e tenebroso. A imensidão daquele ambiente hostil oprimia a minha alma.
O desespero da situação trouxe à minha mente as questões do porquê aquilo estava acontecendo comigo, como eu tinha chegado àquele lugar, quem estava fazendo aquilo comigo. Eu não conseguia entender a insanidade daquele momento.
- Por que eu? -  eu pensava.
- Eu sou um cara comum. Trabalho em um serviço de escritório de uma grande empresa. Tenho uma vida normal, trabalho-casa, casa-trabalho. Às vezes eu saio para me divertir. Mas não há nada na minha vida que a torne diferente, que a torne digna de interesse de alguém. Por que alguém me tiraria da minha zona de conforto e me colocaria nesta situação difícil.
Esses pensamentos cortavam a minha mente em uma velocidade avassaladora transformando-os em uma dor lancinante para minha existência, para o meu ser. Esse estado de coisas me deixou em paralisia não sei por quanto tempo. Talvez tenham sido horas, dias ou apenas minutos, a única coisa que eu sei é que diante do torpor da minha alma eu não pude perceber a passagem do tempo. Se houver descrição viável da miscelânea de  sentimentos e pensamentos que invadiam o meu ser eu poderia dizer que eu via o tempo passar com lenta rapidez, pois conforme eu era atingido por ondas sensações eu via as coisas a minha volta se passarem muito lentamente.
Passado o choque inicial comecei a colocar os pensamentos em ordem e vi que as perguntas que eu tinha feito até ali não levariam a nenhum lugar. O que era mais urgente era resolver aquele problema que se me apresentava e depois tentar responder minhas indagações.
Pensei de forma confiante:
- Sou acostumado a lidar com problemas complicados que envolvem milhões e muitos interesses e nunca me assustei com isso. Muito pelo contrário. É isso que me move. É isso que me fez chegar até a posição em que cheguei. É isso que me faz seguir adiante e que me faz querer mais. Ora essa realidade que me foi imposta agora, não é mais complicada do que outras situações com as quais eu já tive de lidar.
Eu não fui trazido aqui por mágica nem fui jogado de um avião. Então eu devo estar relativamente próximo de algum lugar. Basta eu caminhar que vou encontrar esse lugar. Tudo o que eu tenho de fazer é encontrar o rastro de quem me trouxe aqui.
Com a confiança recém adquirida, que na realidade escondia o meu desespero comecei a caminhar por aquele vasto deserto, com o vento sibilante em meio as suas infinitas dunas. Caminhei por não sei quanto tempo e cai exausto sem encontrar uma marca sequer de presença humana que pudesse indicar como eu fora levada para lá. Minha confiança se esvaneceu e eu comecei a pensar que talvez eu nunca fosse sair daquele maldito deserto, pois a realidade cambiante dele com certeza tinha apagado os rastros que seriam a minha salvação. Não havia esperança para mim. Eu não poderia esperar ser resgatado. Ninguém sabia que eu estava ali. Como, então, eu poderia esperar um surgimento miraculoso de um salvador. Não, não havia esperança para mim. Diante dessa amarga constatação continuei caminhando como uma forma de dar vazão ao grande vazio que tomou conta de minha alma na esperança de que quando todas as minhas forças se extinguissem eu perdesse a minha consciência e não visse a chegada da minha dolorosa morte por fome e sede.
Parecia que eu caminhava há horas, mas o sol parecia estar no mesmo lugar. Será que eu estava perdendo a sanidade e tinha perdido a noção de tempo. Mas se era isso como a perda da sanidade poderia ter ocorrido em tão pouco tempo, pois parecia que o sol não tinha se movido e se ele não tinha se movido fazia muito pouco tempo que eu estava naquela situação. Fui quando um pensamento assustador se apossou de mim. Era bem provável que já estivesse vagando pelo deserto há muitos dias e não tivesse mais lembranças disso.

27 março 2011

O valor da arte tradicional

A arte tradicional é superior à arte moderna, porque é figurativa. Por ser figurativa ela é intuitivamente agradável. É por isso que é muito mais fácil as pessoas se agradarem da Mona Lisa do que de qualquer coisa de Warhol.
Embora as pessoas que não conhecem arte achem que o agrada na arte tradicional seja a técnica, na verdade o que agrada é a composição, ou seja, a execução da obra. E ela agrada porque é intuitivamente bela. Assim, chegamos à conclusão de que o importa mesmo na arte tradicional e figurativa não é o tema, ou seja, a mensagem, mas sim a execução, ou seja, o meio.
Para finalizar posso dizer que arte que precisa de explicação não é arte. Pode ser ensaio, pode ser experimento, mas nunca arte. Assim arte moderna, porque precisa de explicação, não é arte.

18 fevereiro 2009

Não, a língua portuguesa não nasceu em Portugal não!

Para que se possa ter uma correta compreensão do tema faz-se necessário falar um pouco da história de Portugal. A história da Nação Portuguesa inicia-se com Dom Afonso Henriques filho do conde borguinhão Henrique, Conde de Portucale, e Dona Tereza, filha do Rei Dom Afonso VI, de Leão e Castela. A sua sagração cavaleiro, feita por si próprio (sagrar-se é simplesmente armar-se cavaleiro, ou seja, vestir a armadura, embainhar a espada e empunhar o escudo, embora eu não consiga imaginar como alguém pode fazer isso sozinho), à maneira dos reis, que o fazem por eles mesmos, vez que não prestam vassalagem a quem quer que seja, é momento emblemático do início do movimento de independência do Condado Portucalense (Portucale é a origem do nome da Nação Portuguesa. É interessante notar, que antes deste Condado existiu antes um outro, que sempre foi vassalo dos reinos que formaram a atual Espanha, tendo-se convencionado chamar-se esse condado de Condado de Portucale, para diferenciar-se do gérmen da Nação Portuguesa).

E já que se está falando do Condado Portucalense é interessante saber de que forma ele surgiu. O surgimento do Condado Portucalense ocorreu no contexto da luta contra o gentio mouro, que havia invadido a Península Ibérica e obrigado os reinos cristãos ali estabelecidos a recolherem-se à Cordilheira dos Pirineus. Figura importante neste quadro de reconquista é o Rei Dom Afonso VI, de Leão e Castela, que com o auxílio dos primos e Condes Borguinhões, dos quais o nome de um deles já foi mencionado, qual seja, Henrique, sendo o nome do outro Raimundo, casado com Dona Urraca, filha de Dom Afonso VI, de Leão e Castela, expulsou os mouros do território que irá formar o futuramente Portugal. O Condado Portucalense, o qual era vassalo do Reino de Galiza, entregue a Dom Raimundo, foi entregue a Dom Henrique. Referidos territórios haviam sido entregues pelo Rei Dom Afonso VI aos Condes em agradecimento pelo auxílio na luta contra os mouros. Em uma dessas reviravoltas da história o Condado Portucalense passou a prestar vassalagem diretamente ao Rei de Leão e Castela. Tal momento prepara o terreno para a separação definitiva do Condado do Reino da Galiza.

Terminado o parêntese acerca da história do Condado Portucalense voltemos à história de Portugal. Com a coroação de Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal, começa a história do Reino independente de Portugal e ocorre a separação definitiva desse do reino da Galiza, do qual foi vassalo. Cumpre frisar que o Portugal que se tornou independente corresponde apenas ao norte do atual Portugal, pois o sul ainda encontrava-se sob domínio mouro, fato que mais adiante servirá para destacar um aspecto interessante da nossa língua.

Terminado esse intróito acerca da história de Portugal, entra a pergunta, o português surge nesse contexto de independência? Dom Afonso Henriques ao declarar a independência de Portugal baixa um decreto criando o português do nada? A resposta é não.

A língua, que mais tarde se tornará a oficial do Reino de Portugal, já era falada no Reino da Galiza antes de ocorrer esse movimento político, que separou uma região que vinha unida a ele desde que o Império Romano fez a última reforma de suas províncias ibéricas. A reforma criou, na região que hoje abarca a Região Autônoma da Galiza, a de Leão e o norte de Portugal, a província da Gallaecia. Essa era dividida em três conventos, uma delas chamada bracara augusta correspondente ao norte de Portugal, outra chamada lucensis correspondente à Galiza e a terceira asturiensis correspondente à Leão.

A origem da língua falada na Galiza remete à queda do Império Romano e a instauração dos reinos bárbaros, entre eles o suevo, que passou a ocupar o território correspondente ao da antiga Gallaecia.

O idioma que irá mais tarde se chamar português nasce desse amálgama da cultura de origem românica e germânica e passa a ser falado nessa região. Não é preciso dizer, pois por demais óbvio, que o nome da Galiza vem do nome da antiga Província Romana. Assim, esquecendo, por um instante, as questões políticas, não surpreende que o nome do idioma fosse galego, pois tudo que é originário da Galiza é denominado com adjetivo galego. Todavia, como em nenhum lugar do mundo os fatos seguem separados da política, com o idioma não poderia ser diferente e a independência política de Portugal tendo como idioma oficial o galego, não poderia ter outra conseqüência que não tornar aquilo que era próprio da Galiza em marco da nacionalidade portuguesa, qual seja, o idioma. Por razões óbvias o idioma não poderia mais ser chamado de galego, mas sim de português, porque não convêm que o idioma de um Estado independente carregue qualquer nota que indique submissão, ainda que cultural, a nenhuma outra nação. Ainda mais uma pouco prestigiada como passou a ser a Galiza após a independência de Portugal.

Ressalto que o galego não é falado, na Espanha, vez que em Portugal é o idioma oficial, apenas na Galiza. O galego é falado também em Leão. E não deve causar nenhum espanto esse fato, vez que como visto o Reino de Leão, hoje região autônoma de Leão, está historicamente ligado ao Reino Suevo, pois fez parte dele, participando, portanto, do mesmo patrimônio cultural. Desse modo, poderia surgir o questionamento de por que não chamar o idioma de leonês, vez que esse Reino teve uma existência mais duradoura do que o Reino da Galiza. Pelo simples fato de que os adjetivos pátrios, em regra, derivam do nome do território em que se sediam os fatos denominados por essa categoria de palavras e não custa lembrar que o nome do território ocupado pelo suevos era Gallaecia. Assim chamar de galego o idioma dessa região é privilegiar uma reminiscência que remete ao Império Romano e assim preservar um patrimônio histórico antiqüíssimo.

Todavia, eu acredito que o nome do idioma não se perdeu de todo quando se criou o Reino de Portugal. Basta prestar atenção no nome do Reino. A parte final do nome evoca a Galiza e esse nome nada mais é do que a sua adaptação ao romance falado no Reino bárbaro Suevo do original Gallaecia, que por sua vez era derivado de gallo, o qual era a forma como os romanos chamavam todos os povos de origem germânica transalpina e que está na base dos adjetivos pátrios galego, galês, gálata, gaulês, galaico, gaélico (que nada mais são do que os celtas). Por outro lado, basta colocar o sufixo indicador de origem -ês- na palavra Portugal para perceber a proximidade entre o adjetivo pátrio que seria formado e o adjetivo pátrio designativo daquilo que é originário da Galiza. Ficaria mais ou menos assim: PORTUGALÊS. É preciso dizer mais alguma coisa? Se em vez do sufixo -ês- fosse agregado o sufixo -ego- ficaria ainda mais evidente a semelhança, pois ficaria PORTUGALEGO. Se isso fosse feito certamente seria realizada uma justiça histórica com o nosso idioma, pois o nome do idioma deriva do adjetivo pátrio. E de forma alguma seria ferido o brio nacionalista português. Há até a sugestão por parte de alguns grupos galegos reintegracionistas de chamar a região geográfica que vai da Galiza até Portugal de PORTUGALIZA. Isso não deixa de ser um interessante jogo de palavras, pois indica uma adesão da Galiza à Portugal, mas ao mesmo tempo uma galização de Portugal. Veja que em relação ao primeiro adjetivo pátrio sequer ele constitui uma novidade, pois tudo que é originário do Tirol (Cantão Suíço) é tirolês ou tirolesa. Se fosse usado o mesmo processo de formação do adjetivo pátrio para designar aquilo que vem de Portugal, a forma para aquilo que vem do Tirol seria tirês ou tiresa. Na verdade é muito estranho esse modo de formar o adjetivo pátrio daquilo que é de Portugal, visto que a palavra originária perde uma parte importante, qual seja, o final -al-. Para mim a única explicação é a busca de se desvincular o português (ou que tal PORTUGALÊS) do galego.

Voltando ao Reino de Portugal. Esse após a independência nunca se viu livre da ameaça dos reinos que mais tarde formariam a Espanha, tanto é que o Rei Dom Afonso Henriques, mesmo após a independência tornou-se vassalo do Rei de Castela e Leão para garantir o seu trono. Por outro lado Portugal continuou sua expansão para o sul, expulsando o mouro e talvez para garantir que tais territórios não fossem retomados o centro político de Portugal sofre um deslocamento para o sul, tornando-se, assim, a região mais importante de Portugal, de forma a consolidar cada vez mais o esquecimento acerca da origem minhota do idioma. Isso irá explicar um fato interessante do nosso idioma, que tem, como não poderia deixar de ser, uma pitada de política. Como disse, Portugal nunca se viu livre da ameaça de anexação pela Espanha, ensaiada na Batalha de Aljubarrota e concretizada durante os 60 anos de união pessoal entre o Reino da Espanha e Portugal. Tal fato alimentou o medo de uma assimilação cultural. Isso forçou os portugueses a realizarem um movimento de consonantização do idioma para diferenciá-lo do castelão (o idioma chamado de espanhol. Língua que em realidade não existe). A promoção dessa mudança foi patrocinada principalmente pelo centro político de Portugal localizado em Lisboa e que veio a caracterizar o sotaque que nós achamos que é o português. A consonantização do idioma português o diferenciaria do castelão pelo fato de que esse dá maior ênfase nas vogais. Tal fato marcou mais um distanciamento entre o português e o galego, ou português da Galiza. No entanto, isso não é tão determinante, pois os minhotos, embora o modo de falar deles não seja prestigiado em Portugal, permaneceram falando um português com maior ênfase nas vogais. E para alegria dos galegos, os brasileiros também falam um português bastante vocalizado, tanto que quando um galego chega ao Brasil não sente dificuldade nenhuma de compreensão.

Todavia, os percalços do galego-português não terminam com a separação do Reino de Portugal. Quando surge o moderno Reino da Espanha com o casamento dos Reis Católicos, Fernando de Aragão e Isabel de Castela, o galego sofre repressão que irá durar um período de 500 anos e mesmo assim não deixa de ser falado. Isso marca o aspecto inusitado da situação do português na Galiza. Enquanto em Portugal o galego é idioma de erudição, de cultura, na Galiza ele é um idioma de gente simples e ignorante, portanto, desprestigiado. Isso ocorreu pelo fato de que durante os 500 anos de repressão sofridos pela Galiza por parte do Reino de Castela, sede do poder central espanhol, a elite galega foi substituída por uma elite castelã. Essa elite, por óbvio falava castelão. Sendo assim, os únicos falantes do galego durante esses 500 anos foram as pessoas do povo, regra geral pouco instruídas. Ademais, foi proibido o uso do galego nesse período. Por essa razão não houve produção literária nesse período. Não sem razão esse período é chamado de anos escuros do português galego.

É interessante notar que por pouco a Espanha também não se torna um Reino Galegófono, pois durante séculos a língua culta da península ibérica (já que não faz sentido falar em Portugal ou Espanha antes que estes venham a existir) foi o galego. No entanto, isso mudou quando Afonso X ascendeu ao trono Castelão-Leonês (já nesse período tinha se concretizado uma união real entre os reinos), pois embora ele tenha prestigiado o galego, mandando compor famosas cantigas nesse idioma, ele tornou o castelão o idioma oficial do Reino, marcando o declínio daquele. É nesse contexto também que o galego recebe influência provençal. Um interessante documentário sobre esse tema pode ser visto na página da Televisão Regional da Galiza no endereço http://www.crtvg.es/tvgacarta/index.asp (língua de reis, língua do povo).

Assim, retomando o título, podemos dizer que o português nasceu no Reino bárbaro Suevo. Foi transmitido ao Reino Leonês-Galego (nessa ordem, já que o Reino de maior importância política foi o de Leão, sendo o da Galiza em maior parte de sua história um reino vassalo) que abrangia a região do atual Leão, Galiza e norte de Portugal. Por fim, foi aperfeiçoado pelo Reino do Porto (Portugal). Assim, o nome da nossa língua deveria ser PORTUGALEGO, pois tal nome teria a vantagem de destacar o importante papel do Reino do Porto no aperfeiçoamento do idioma, com a sua normalização, normatização e classicização, sem, no entanto, deixar que registrar que se trata da mesma língua falada no antigo Reino Suevo, visto que não houve mudança de estrutura significativa. Sugiro a quem quiser tomar conhecimento sobre o tema pesquise o período galaico-português ou galego-português.

07 outubro 2008

Divisas protegem as nações contra a crise?

O fato de um país ser detentor de ativos financeiros denominados divisas cambiais ou reservas financeiras, em altos patamares para os padrões de comércio internacional, protegem-no da crise econômica mundial?
Vamos a um exemplo trivial para tornar mais clara a questão. O barbeador Mach 3 da Gillete. Quem utiliza esse aparelho não sabe que está fazendo parte de uma sofisticada operação comercial. Como? Simples. Para a pessoa adquirir um cartucho de reposição do aparelho, após o que ela que está usando acabar, basta se dirigir a um supermercado. Por sua vez o supermercado para fazer a mercadoria chegar ao consumidor procura um distribuidor e esse por sua vez procura a Gillete do Brasil. Mas a coisa não termina aí não, pois se fosse o fim da cadeia seria uma operação comercial simples.
Se os meus caros leitores já prestaram atenção ao que está escrito na caixa do cartucho, verão que ele é fabricado nos Estados Unidos da América. Assim, a Gillete do Brasil compra da Gillete dos Estados Unidos da América os cartuchos de Mach 3. Fácil não?!
Só que a coisa não é tão simples quanto parece. Em primeiro lugar, essa operação comercial envolve relações entre estados soberanos. Por quê? Porque não existe uma ordem jurídica mundial e assim o comércio só pode se dar entre países ou nações que primeiramente estejam dispostas a isso, pois só assim os contratos celebrados terão validade. Em segundo lugar, essa operação comercial inclui uma operação cambial. Qual? Para comprar as coisas nos Estados Unidos da América é preciso dólar, pois lá eles não aceitam real. Eis aí a operação cambial. Além disso, ela constitui uma operação de comércio exterior, ou seja, não basta ter o dólar, eu tenho de achar alguém lá fora disposto a vender para alguém aqui dentro em vez de realizar essa transação em seu mercado doméstico e para que haja o dólar aqui tem de ter havido uma transação em sentido contrário daqui para lá.
Agora vamos ver de que forma esse exemplo se encaixa nos fatos que vem ocorrendo. Primeiramente, divisas só servem para regular a taxa de câmbio e serem utilizados no comércio exterior, ou alguém usa dólar aqui no Brasil para comprar no supermercado? Segundo, não é apenas a taxa de câmbio que influencia na determinação do preço da mercadoria importada, mas também a disponibilidade do bem no mercado externo. E qual é o quadro que se desenha no momento para a crise? Depressão de oferta. Assim não haverá no mercado exterior bens e serviços em quantidade suficiente para atender os mercados interno e externo. Temos assim que a presença de divisas não poderá conter a inflação dos produtos importados, sendo que o aumento do crédito neste caso terá um efeito amplificador dela.
Assim a presença de divisas não protegerá nenhuma nação da crise, pois no mercado externo, onde essas podem ser usadas não haverá bens e serviços em quantidade suficiente para atender a demanda interna dos países exportadores.
No caso do Brasil, no que se refere a produtos importados, sofreremos triplamente: com o aumento da taxa de juros, deterioração da taxa de câmbio e com a inflação no mercado externo.

05 outubro 2007

Por que os senadores tem mandato de oito anos?

Você sabe por que o mandato dos senadores é de oito anos? A pergunta é pertinente, pois é o único caso em nossa república. Se é uma exceção deve haver um motivo muito forte para isso.
E há. Como é do conhecimento de todos o Brasil é uma república federativa. Se o Brasil é uma república quem outorga o poder as autoridades públicas é o povo. A outorga do poder aos dignatários da nação se dá por meio de eleições periódicas que irão culminar na concessão do mandato político, ou seja, poder para agir em nome do povo. Por outro lado o fato de o Brasil ser um Estado federativo indica que o ente central surge da união de outros entes menores. No modelo clássico, os estados, no Brasil além destes dos municípios. Esse é o famoso pacto federativo, ou seja, o acordo entre os entes que formarão o novo estado para que este possa vir a existir. Com essas características só existe um, a Constituição Federal dos Estados Unidos da América. Referida Constituição criou os Estados Unidos da América. No caso do Brasil é um mero formalismo consignado na nossa Constituição Federal, pois não houve acordo nenhum para criação de nada. Ninguém em sã consciência advogaria o posiocionamento de que pelo simples fato de ter instaurado-se uma constituinte em 1988 qualquer dos estados brasileiros poderia valer-se do inexistente direito de secessão, alegando não mais lhe interessar permanecer constituindo o Brasil.
Voltando ao assunto que nos levou a criar a presente postagem, como o estado federado é criado pela soma ou união de entes menores, estes, no modelo clássico, reservaram-se o direito de participar da formação da vontade do novo estado criado por eles e, portanto, da vontade nacional. O meio encontrado para isso foi a criação do senado federal. Esse modelo foi importado para o Brasil, valendo-se do fato que no império existia uma instituição chamada senado, que nada tem a ver com o senado federativo. A explicação aqui fornecida já é suficiente para compreendermos porque todos os estados tem a mesma quantidade de senadores, pois juridicamente todos são iguais. Se são iguais nenhum deles pode ter mais representantes.
Neste ponto já é possível explicar-se satisfatoriamente porque o mandato dos senadores é de oito anos. Se o Brasil é uma república, logo os representates do povo detém poder por um período determinado de tempo, e é uma federação, formada pela união dos entes menores, temos a seguinte situação, periodicamente há possibilidade de mudança de todos os dignatários da nação com evidente prejuízo para continuidade de governo da nação, o que traz o enfraquecimento e a possibilidade de secessão. Ora se o senado é a câmara de representação da opinião dos Estados, temos que o senado é a câmara que representa a união, enquanto que a câmara dos deputados representa o povo, logo a manutenção de parte dos senadores por mais de um período eleitoral visa garantir a unidade e a manutenção da atividade de governo do Estado brasileiro. Essa é a razão pela qual um senador tem mandato de oito anos, ou seja, para que seja mantida a continuidade do governo da nação, que restaria prejudicada se a cada quatro anos houvesse completa renovação dos dirigentes.

14 maio 2007

Física metafísica (a ciência como religião)

Verifica-se cada vez mais a negação da religião em conseqüência dos chamados progressos científicos, que desmascaram o misticismo dos cultos às divindades ou à espiritualidade. No entanto, encontra-se a ciência revestida realmente da pretensa objetividade (quando falamos de objetividade, queremos dizer imposição do objeto ao sujeito, não sobrando espaço para qualquer impressão deste a respeito daquele) que lhe daria primazia sobre a religião, a qual restaria relegada a mera alegoria (ou seja, estórias que valeriam apenas pelo seu conteúdo moral)?
O primeiro ponto a ser ressaltado é que qualquer ciência (humana diria eu, pois se produzida por seres humanos só pode ser qualificada como humana) antes de ser quantitativa é qualitativa, pois apenas um juízo de valor aplicado aos fenômenos estudados permite identificar aquilo que deve ser observado. Só por esta constatação inicial fica afastado o caráter eminentemente objetivo das ciências ditas exatas, dentre elas a física, pois a observação depende de um juízo subjetivo daquilo que tem relevância nesta. Mas o argumento final contra cientificismo (nome bom para substituir misticismo) de nosso tempo é o fato de que a razão não é a medida de todas as coisas, ou melhor dizendo, a razão humana não é absoluta, pois o ser humano não é absoluto, do contrário seria Deus, não podendo, portanto, erigir-se em selo de existência de algo. Dito de outra forma, não é porque não somos (nós os seres humanos) capazes de entender algo, que isto não exista.
Assentado o ponto acima voltemos ao fato que nos levou a criar esta postagem, o fato de a física colocar-se como a ciência das ciências, a ciência que pode e deve explicar todos os fenômenos do universo, desde o comportamento das partículas elementares até manifestações culturais. Não é a toa que o graal dos fisicistas (em outros tempos diríamos alquimistas, mas ao utilizar este termo agora seriam cometidas duas impropriedades, a primeira anacronismo, a segunda é que a alquimia encontra-se mais ligada a química do que a física) é a teoria do tudo, ou melhor, a equação do tudo. De forma mais clara uma expressão algébrica, provavelmente escrita com poucos termos, tal qual e=mc2, que poderia explicar todo o universo, desde o bater de asas de uma borboleta até o seu pensamento mais íntimo e melhor ainda, com poder de prevê-lo.
Para entender melhor voltemos ao início de toda essa insanidade que chamam de ciência moderna, ou mais propriamente de física, último bastião de loucos de todo gênero.
Na década de 20 ou de 30 um sujeito chamado Edwin Hubble (não é mera coincidência o nome do telescópio se chamar Hubble) descobriu um fato intrigante. Todas as galáxias estavam se afastando da Terra. Você poderá perguntar como ele descobriu isso e o que é que tem demais nisso. Resposta para primeira pergunta. Ele descobriu que as galáxias se afastavam da Terra em decorrência do efeito doppler. Sim aquele mesmo do ultrassom. O efeito doppler é uma deformação provocada nas ondas quando a origem desta está se movendo em relação ao objeto que é atingido por elas. Esse efeito é sentido tanto em ondas mecânicas quanto eletromagnéticas. Um exemplo claro dele pode ser visto ou ouvido quando um carro que tem um som bem potente se aproxima de nós e o som parece que vai se tornando cada vez mais grave e quando ele se afasta parece que o som vai se tornando cada vez mais agudo. O meu leitor dirá, "o que raio tem a ver o som do carro com as galáxias", e eu respondo, tudo. O mesmo efeito que se verifica com o som ocorre com as ondas luminosas. Sim, pois para a física moderna a luz é tratada como uma das formas que as ondas eletromagnéticas podem assumir, aplicando-se boa parte das conclusões a respeito das ondas mecânicas a estas, tendo como principal exceção o fato de que estas não transportam matéria quando se propagam, como por exemplo as ondas do mar. Assim, é fácil concluir, que pelo efeito doppler, quando a origem de uma fonte de luz se afasta do observador as ondas luminosas que chegam aos olhos dele tendem a se alongar, ou melhor, diminuir a freqüência ou utilizando uma linguagem mais próxima da de um físico (sem qualquer pretensão de ser um desses loucos) se tornam menos energéticas, o que de certa forma ajuda inclusive a fixar a imagem do efeito doppler, pois quanto mais longe uma onda se propaga mais ela difunde sua energia. Lógico, não! E você achava que física era troço de outro mundo. Desta forma, a luz vinda das outras galáxias tendia de um estado mais energético para um nível mais baixo de energia, ou seja, tendia do azul para o vermelho, isso sem exceção. Provado que as galáxias estavam se afastando da Terra, sem exceção, qual a grande descoberta. Justamente esta, ao contrário do que poderia sugerir o senso comum em todo universo com todas as galáxias se movimentando em todas as direções não havia uma sequer que estivesse se aproximando da Terra. Estranho, não! Pois é, muita gente também percebeu isso e logo tratou de achar uma explicação lógica para isso. Pelo menos é isso que eles pensam que ela é. Qual foi? Olhar para as estrelas. Aí vocês dirão, "engraçadinho, é lógico que eles olharam para as estrelas, ou seja, para o universo para explicar esse fenômeno". Só que a verdade não é exatamente essa. Eles não olharam para nenhuma galáxia ou estrela existente, mais sim para o que dizia a teoria da relatividade em relação ao comportamento de estrelas massivas (as grandonas). O que acontece com estrelas no fim da vida útil delas (no caso das grandes)? Elas implodem, ou dito de maneira mais adequada, elas sucumbem sob o "peso" da força da gravidade, arrastando toda a sua matéria para o centro. Mas, segundo a teoria da relatividade, não é apenas isto que ela arrasta para o centro, ela arrasta o espaço e o tempo também, pelo fato de a gravidade ser vista pela teoria como uma distorção dessas duas entidades, ou melhor, do complexo espaço-tempo, pois o tempo para a teoria é visto apenas como um lugar no espaço. Muito bem, e onde é que essa conversa toda vai chegar? Vai chegar no ponto, literalmente falando. Ou seja toda estrela e o espaço em volta vão ser reduzidos a um ponto. Mas não é um ponto como você poderia imaginar, como por exemplo, o ponto final. O ponto da física é o ponto geométrico, ou seja, o ponto sem nenhuma dimensão. Aquilo que nós chamamos de ponto, por exemplo o ponto final pingado no fim de um período, na realidade tem as três dimensões se pensarmos da perspectiva da física, pois se usarmos um microscópio muito potente veremos que o ponto tem um raio (se ele fosse um círculo perfeito e em regra trata-se de um borrão, ou seja, a realidade não é muito dada a respeitar as convenções do intelecto humano), o que já o dota de duas dimensões. Utilizando um microscópio mais potente ainda, veremos que a uma parte da tinta fica entranhada sobre as fibras do papel, ou seja, ele tem altura. Em resumo, descarte a sua noção de ponto e tente imaginar um ponto como visto ou, como diriam os físicos, observado pela física. Tente imaginar uma coisa sem dimensão nenhuma. Sem altura, sem largura e sem comprimento. Conseguiu? Nem eu. Esse ponto não pode ser imaginado, pois como diz a palavra, imaginar é criar uma imagem e como é que se cria a imagem de algo que não tem nenhuma expressão espacial. Pois é, é isso que a física moderna diz que acontece com as estrelas grandes. Em síntese, elas se concentram em um ponto invisível, pois se ele não tem nenhuma dimensão é invisível no espaço. Mais o negócio não para aí não. Como a estrela arrasta o espaço-tempo junto, para esse ponto, o ponto vai atraindo cada vez mais o espaço-tempo, de forma que esse vai se concentrando até chegar no ponto, mas como ele não tem dimensão nenhuma aquele vai se concentrando infinitamente. Coloque a seguinte imagem em sua cabeça o ponto é uma nota de cem reais que está amarrada em um barbante que está preso em uma vara que está colocada em suas costas de forma que a nota fique a uma distância que os seus braços não possam alcançá-la. Muito bem, isso faz parte de um jogo no qual se você conseguir desempenhar a tarefa ganhará os cem reais. Qual é a sua missão? Pegar a cédula correndo atrás dela. "Epa! espera aí", você dirá, e completará com a seguinte constatação "toda vez que eu der um passo a nota se afasta um passo, então eu nunca vou conseguir pegá-la nunca". Pronto! você entendeu o que acontence com o espaço tempo-tempo e o tal ponto. Isso permite uma outra conclusão importante, o tal do ponto, então, fica fora do espaço e do tempo. Mais o que isso tem a ver com o universo? Tudo, segundo os físicos. Relembrando, descobriu-se que as galáxias se afastam da Terra, o que levou a conclusão óbvia de que só em uma hipótese isto seria possível, o universo está se expandindo. Mas não é como você está imaginando não. A expansão do universo é assim, espaço, veja bem, espaço, lugares, estão surgindo no universo. Vamos a um exemplo. Olhe para a sua casa e a do vizinho do lado. Provavelmente entre as duas casas só há um muro ou cerca. Mas imagine que um belo dia você chegue em casa e entre você e o vizinho haja uma nova casa em um terreno que não existia quando você saiu. Eis a tal expansão do universo que os físicos tanto falam. Você dirá "não acredito". Então passe acreditar. Prepare o seu estômago, porque ainda não terminou. Agora vem o "grand finale". Fazendo uma analogia entre o universo e a nossa amiga estrela que virou um ponto e revertendo a expansão para contração, o que nós temos? A origem do universo segundo a física moderna, ou seja, um ponto invisível, que não estava em lugar nenhum em um tempo antes do tempo. Ei, mas espera aí, não era a física que se colocava contra a narrativa sem sentido da religião? E isso aí em cima parece ter algum sentido? Para mim não.

24 abril 2007

Direito orçamentário

  1. Dia 31/12 o exercício encerra para contração de débitos (realização de despesa), mas não para o seu processamento.
  2. Empenho implica em realização de despesa.
  3. Despesas não lançadas em restos a pagar devem ser pagas na rubrica despesas de exercício encerrado.
  4. Só se deve reconhecer dívida não empenhada.
  5. O encerramento do processamento de despesas pode ser estabelecido por decreto, vez que a lei não o faz.
  6. As despesas só deverão ser empenhadas na dotação restos a pagar com prescrição interrompida depois do encerramento do processamento de despesas. Não depende de reconhecimento e deve ser inscrita na dívida pública fundada, ou seja, aquela com exigibilidade superior a 12 meses.
  7. Vige em relação às despesas o regime de competência, logo considera-se efetivada esta quando se assume o compromisso de seu pagamento, indiferente de quando este venha ocorrer.
  8. O compromisso de pagamento surge com a assinatura do contrato e orçamentário-financeiramente com o empenho que deve espelhar o compromisso contratual.
  9. Assim contrato cuja execução atravesse o exercício em que houve a contratação, devendo ser empenhado sobre crédito do exercício da contratação, indiferente de quando ocorre o pagamento.
  10. Despesas cujo pagamento deva efetivar-se no exercício seguinto só deverão ser contraídas se hover reserva de recursos financeiros suficientes para seu adimplemento.
  11. Despesa de pronto pagamento é hipótese definida legalmente (por uma mera questão de conveniência e afinidade foi definida na lei de licitações e contratos) e para a qual pode ser utilizada a realização de despesa em regime de adiantamento.
  12. despesas de pronto pagamento são aquelas que a experiência aliada aos fatos e suas circunstâncias demonstrem a necessidade de pagamento imediato. São aquelas em que é impossível a realização da despesas sem o imediato pagamento pelo desinteresse dos fornecedores devido à desproporção entre o valor e a complexidade da operação de venda e a pequena monta do objeto vendido. Serve para pagamento de material para consumo imediato, ou seja, pequena quantidade e serviços de pequeno valor, como definido na lei, ou seja, até 4.000,00. É recomendável que se faça a prova da efetiva prestação do serviço por meio de um documento do fato conexo que o ensejou (por exemplo, quando a descarga ocorrer por causa de uma apreensão fazer prova da apreensão).
  13. Tal procedimento tem por base o princípio da eficiência que não se coaduna com um procedimento com custo maior do que a finalidade a ser atingida, ou seja, não se admite o dispêndio de atividade administrativa de controle que se mostre excessiva do ponto de vista operacional financeiro em relação ao objeto controlado. Quando a lei fala em não subordinar-se ao processo normal de aplicação abrange as exigências da lei de licitação no que diz respeito à prévia habilitação, pois, conforme já mencionado tal matéria é apenas conexa ao tema licitação e por mera conveniência em face da conexão foi tratada em tal lei.

07 fevereiro 2007

Liberdade de escolha de profissão

A liberdade de escolha de profissão significa simplesmente que não existem profissões reservadas a determinados grupos sociais como um privilégio. Todavia não afasta a necessidade de capacidade para o seu exercício.
Tal liberdade é a consagração do princípio democrático e do regime republicano, que vedam o estabelecimento de privilégios.

União, Estados e Municípios

Rapidamente. À União devem ser reservadas as competências legislativas e materiais, ou seja, de fazer leis e prestar determinados serviços, que garantam a unidade da nação. Assim a União só deveria ter reservadas competências, em uma verdadeira federação ou verdadeiro pacto federativo, que fossem necessárias à preservação da unidade. Aos Estados, componentes da federação, caberia as demais competências. Tal competência é denominada residual, de modo a garantir a mais ampla autonomia estadual.
Deste modo, é evidente que cabe à União editar normas gerais, ou seja, normas que irão orientar os futuros ordenamentos jurídicos dos Estados de modo a garantir a unidade de princípios em todos os níveis de administração.
No caso do Brasil, apesar da brutal concentração de competências nas mãos da União, o que por si só já seria suficiente para afetar a noção de federação, podemos conciliar tal fato com a existência de um estado federativo, desde que não se anule a ampla autonomia que se reserva aos Estados em matéria de competência residual. Deve ser lembrado que os Estados membros não tem competência residual tributária.
De que forma isto se daria? Com normas gerais editadas pela União com baixo nível de concreção de modo a garantir aos Estados membros editar normas complementares mais concretas, cabendo ao Supremo controlar os abuso.
Cabe abrir um parêntese aqui, como no Brasil formalmente adotou-se o posicionamento de se colocar o município como ente da federação, há de se ressalvar que a sua autonomia é menor em relação àquela que é outorgada ao Estado membro, pois este é o componente primário daquela.
Por fim, não posso deixar de mencionar que em um Estado federativo não existe hierarquia entre os entes componentes, logo não há qualquer norma que dite a obediência dos entes menores aos atos administrativos gerais originários do ente maior, sob pena de esvaziamento da idéia de autonomia, que pode ser resumida em uma palavra, não-intervenção.

12 janeiro 2007

Decreto de execução

Quando nós estudamos Direito Administrativo vemos o professor Hely Lopes Meirelles dizer que o decreto não deve ser uma mera reprodução da lei, pois se tal ocorresse seria inútil. Continua, o mesmo professor, o decreto deve detalhar a lei.
Mas afinal de contas o que significa isso? Se você como eu sempre teve essa dúvida, agora talvez eu possa ajudá-lo a clarear o seu entendimento a respeito da matéria.
Vamos às obviedades. O Poder Executivo existe para dar execução à lei. Mais especificamente. O Executivo detém o instrumental necessário à implementação prática da lei. Um exemplo deixará mais claro. Uma lei pode dizer que um determinado tratamento de saúde é direito do povo. Para concretizar esse direito o Executivo conta com um hospital onde mobilizará os recursos materiais e humanos necessários para tanto.
É aqui onde o decreto entra. A forma de prestar o tratamento pode ser escolhida ao bel-prazer de quem se encontre atendendo no momento? Não. O decreto de execução conterá uma instrução para os serviços públicos de que forma o direito será implementado. Mais um exemplo para tornar claro. O decreto poderá estipular documentos que deverão ser apresentados, exames necessários à uma eventual internação etc. Além de ser uma ordem genérica a todos os servidores dos serviços públicos o decreto vai estabelecer a forma de utilização dos serviços públicos que irão concretizar os referidos direitos.
Por esta última conclusão resta claro que o particular sujeita-se a eles quando busca um serviço público, mas o decreto não se estende além do serviço público, motivo pelo qual, por exemplo uma lei como o código civil jamais admitirá um decreto de execução, pois não depende do Estado para que os direitos ali consagrados se consubstanciem.

04 janeiro 2007

Razoabilidade e proporcionalidade

Em regra vemos os autores falarem em razoabilidade e proporcionalidade, mas sem, contudo, exporem as suas essências ou entranhas. Eles geralmente intuem o que elas sejam, mas parecem não conseguir traduzir em palavras o venha a ser a razoabilidade ou proporcionalidade.
Vou agora propor conceitos, que na minha humilde opinião talvez sirvam para fixar um marco divisor entre as duas espécies. Pode-se falar em razoabilidade quando os meios empregados sejam adequados aos fins almejados. Ou seja, quando os meios guardem estreita correlação com os fins (iria utilizar a palavra proporção, que seria muito mais significativa, mas para evitar quaisquer enganos em relação à proporcionalidade a substituí por correlação). Um exemplo traduzirá melhor o que tento dizer. Imaginemos que um dado empregado de uma dada empresa inicie uma discussão com colega de trabalho e venha a destratá-lo chamando-o de imbecil. À empresa é facultado aplicar-lhe uma entre três espécies de punição pela falta cometida. São elas advertência, suspensão, dispensa. Dentre as três qual a melhor se adequaria ao fato? Pronto você ao responder à pergunta acabou de utilizar a razoabilidade. Neste ponto alguns poderão indagar, mas qual é a resposta certa: advertência, suspensão ou dispensa? Ao que eu respondo que não há resposta certa, pois pelo princípio da razoabilidade todas estão corretas. Por mais impressionante que seja é isso mesmo, pois o princípio abebera-se em altas doses de subjetividade, não devendo, no entanto, afastar-se muito do que determinaria o senso comum para o fato específico do qual o juiz é portador. Tal constatação é que permite a magia da advocacia. É nestes espaços que necessariamente devem ser preenchidos no caso concreto que atua o advogado. Também não veja-se isso como um mal, pois seria impossível uma lei regular de forma justa cada um dos fatos, com as nuances que os diferenciam de todos os demais, no mundo fenomenológico, ou seja, cada fato é essencialmente circuntancial e por assim dizer único, não se podendo dizer, pois, essencial, embora apresentem algumas características básicas que permitem elaborar normas que irão orientar o julgamento. Todavia tais características só podem ser constatadas dentro das circunstâncias dos fatos, motivo pelo qual temos juízes, advogados e promotores. Voltando ao exemplo da punição do empregado, para que uma lei estabelecesse justamente a punição nela própria, independentemente de qualquer juízo de valor do aplicador dela, deveria informar como a briga deveria começar (mas não de forma genêrica e sim específica, por exemplo quando o João, que é uma pessoa de pouca paciência, começar uma briga... e tal só valeria para o João esquentadinho) quais as palavras específicas de agravo que deveriam ser proferidas, que certamente é impossível, pois em última instância terminaria por implicar na necessidade de uma lei para cada fato específico da vida de cada ser humano que está sobre a face da terra, o que em último caso implicaria na supressão da própria idéia de lei.
Voltando ao tema. Proporcionalidade por seu turno é a aplicação na medida adequada dos meios aos fins propostos. Ou seja, no caso da proporcionalidade não nos interessa a modalidade do meio e sim a quantidade. Novamente um exemplo vai esclarecer. No exemplo acima, se a punição selecionada fosse a suspensão, esta poderia ser de um a trinta dias. Qual a quantidade de dias de suspensão puniria adequadamente o fato? Quem nos dará a resposta será o princípio da proporcionalidade, nos mesmos termos do princípio da razoabilidade, ou seja, por meio do senso comum do juiz.
Wagner Alcântara. Advogado